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Multa astreinte nas obrigações de fazer: Pressão legítima ou excesso judicial?

A multa diária no CPC/15 visa garantir o cumprimento das decisões judiciais. O artigo analisa sua aplicação, revisão e limites jurisprudenciais.

Por Flávia Gramdchamp

A multa diária (astreinte) prevista no CPC/15 é uma ferramenta voltada à efetivação das decisões judiciais, especialmente em obrigações de fazer ou não fazer. Este artigo analisa, de forma direta e fundamentada, quando e como essa multa pode ser aplicada, os critérios para revisão de seu valor e os limites impostos pela jurisprudência.

  1. Por que a multa astreinte é necessária – e como pode ser aplicada?

Para garantir que decisões judiciais sejam efetivamente cumpridas, o CPC permite ao juiz fixar uma multa cominatória (astreinte) como forma de coagir a parte devedora ao cumprimento de uma obrigação de fazer ou não fazer.

Essa multa pode assumir diferentes formas: diária, por ato, semanal ou mensal, dependendo da natureza da obrigação e da estratégia de coerção mais adequada ao caso. O art. 537 do CPC/15 concede ao magistrado ampla liberdade para fixar o valor e a forma de incidência, sempre com base nos princípios da razoabilidade e proporcionalidade.

Diferente de uma punição ou indenização, a astreinte é uma medida coercitiva e instrumental, ou seja, busca forçar o cumprimento da ordem judicial, e não punir ou compensar.

  1. O que a lei exige para que a multa seja válida?

A multa só é válida se respeitar três condições:

A decisão judicial precisa impor uma obrigação de fazer ou não fazer;
A multa deve ser fixada de forma expressa na sentença ou decisão interlocutória;
A parte devedora deve ser intimada pessoalmente, especialmente se for órgão público (conforme súmula 410 do STJ).
Sem o cumprimento desses requisitos, a multa pode ser afastada ou suspensa.

  1. Como e quando a multa pode ser aplicada?

A multa astreinte prevista nos arts. 536 e 537 do CPC pode ser aplicada de diferentes maneiras, a depender do tipo de decisão judicial e do momento do processo:

Multa na tutela provisória (urgência ou evidência): Quando o juiz concede uma decisão liminar ou tutela antecipada, ele pode desde logo fixar uma multa diária para garantir o cumprimento da medida (art. 297, parágrafo único, e art. 300, CPC).
Multa na sentença ou no cumprimento de sentença: Pode ser fixada na própria sentença, quando se impõe uma obrigação de fazer ou não fazer. Se a parte não cumprir espontaneamente, a multa poderá ser aplicada durante a fase de cumprimento de sentença.
Multa na execução de título extrajudicial: Mesmo nos casos de execução de título extrajudicial que contenha obrigação de fazer, o juiz pode impor a multa como forma de coerção, nos termos do art. 814 do CPC.

  1. Qual o valor justo da multa? Como ela é fixada? Pode ser alterada?

A multa astreinte tem caráter coercitivo. Sua função é pressionar a parte devedora ao cumprimento da decisão judicial. Por isso, sua fixação deve levar em conta a natureza da obrigação, o comportamento da parte, a urgência da medida e o contexto fático.

a) A periodicidade da multa é flexível:

O CPC não exige que a multa seja diária. O juiz pode fixar:

Multa diária, quando o cumprimento é contínuo;
Multa por ato, quando o dever é pontual;
Multa semanal ou mensal, a depender da obrigação.
A definição cabe ao magistrado, considerando o que for mais eficaz para compelir o cumprimento da ordem.

b) Pode ou não haver limite máximo:

Embora a lei não determine um teto para a multa, os tribunais costumam impor limites ao valor final acumulado. O juiz pode estabelecer um valor máximo desde o início ou reduzi-lo posteriormente, nos termos do art. 537, §1º do CPC.

  1. O que dizem os tribunais?

A jurisprudência tem deixado claro que:

A astreinte é válida mesmo contra a Fazenda Pública (RE 592.377/STF), desde que haja intimação pessoal do ente público;
A multa pode ser revisada se se tornar excessiva, mesmo após o cumprimento da obrigação (REsp 1.333.988/SP, STJ);
A finalidade da multa é coagir, e não punir – por isso, ela deve ser usada com equilíbrio.

  1. Exemplos práticos de aplicação

A multa diária é comum nos seguintes tipos de ações:

Saúde: Fornecimento de medicamentos ou internação determinada por decisão judicial;
Serviços essenciais: Restabelecimento de energia elétrica, internet ou água;
Educação: Matrícula de alunos em escolas públicas ou fornecimento de documentos;
Direitos do consumidor: Retirada de nomes do SPC/Serasa ou entrega de produtos;
Meio digital: Remoção de conteúdo ofensivo de redes sociais ou sites.

  1. Conclusão

A multa cominatória, prevista nos arts. 536 e 537 do CPC, representa importante instrumento de efetivação da tutela jurisdicional, especialmente em obrigações de fazer ou não fazer. Sua função é eminentemente coercitiva, ou seja, busca compelir a parte ao cumprimento da ordem judicial, e não punir ou compensar financeiramente a parte adversária.

A possibilidade de fixação da multa de forma flexível – seja diária, por evento, semanal ou mensal – e sua modificação a qualquer tempo (inclusive de ofício), garantem ao magistrado os meios necessários para adaptar a medida às peculiaridades do caso concreto, sempre com base na proporcionalidade, na razoabilidade e na vedação ao enriquecimento sem causa.

Além disso, a jurisprudência consolidada no STJ e no STF tem reforçado a legitimidade da astreinte, inclusive contra a Fazenda Pública, desde que observados os requisitos legais, como a intimação pessoal e a congruência entre valor e finalidade da multa.

Conclui-se, portanto, que a multa astreinte deve ser aplicada com critério técnico, como ferramenta de efetividade e não como penalidade ou fonte de lucro. Sua adequada utilização representa um equilíbrio entre a autoridade da decisão judicial e os limites estabelecidos pelo devido processo legal.

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